As formas fixas.
I.
Senão vejamos: existem duas possibilidades de se olhar para as formas fixas. OU se olha da perspectiva do leitor OU se olha da perspectiva do autor. Da perspectiva do leitor, a forma fixa é uma recorrência de padrões formais que permite identificar um poema ou um recorte dele como sendo pertencente a determinada categoria. E como se pode ver, temos um tipo de forma fixa que se caracteriza pelo fato de englobar todo o poema, enquanto outra engloba apenas parte do poema, geralmente uma estrofe. A diferença entre ambas é o fato de que este segundo tipo possui uma estrutura em aberto, permitindo uma expansão indefinida. É o caso da oitava rima ou da terça rima (mas esta última possui o detalhe do verso final, que já aponta, muito engenhosamente, é claro, para uma indefinibilidade-definida). O primeiro tipo, da forma fixa que engloba todo poema, tem como característica o fato de que sua caracterização estipula também um número de versos para o poema. Seria o caso da sextina ou do soneto.
Da perspectiva do autor, posso dizer que a forma fixa é uma maneira de proceder formal para com um espaço poemático determinado. Este espaço, como acabamos de ver, pode englobar o poema todo ou uma parcela do poema. Assim, a oitava rima, que envolve apenas uma estrofe, é um modo de proceder formal para com um espaço de oito versos de modo que o primeiro verso rime com o terceiro e o quinto, o segundo com o quarto e o sexto, e o sétimo e o oitavo rimem juntos.
O conluio entre as duas perspectivas é muito importante. Pois, embora a história das formas fixas seja uma história marcada pela arbitrariedade, não posso simplesmente pegar a estrofe de Poe em The Raven e dizer que aquilo ali é forma fixa. A forma fixa implica uma aceitação tanto do leitor, para que a perspectiva do leitor se valide, isto é, que se reconheça a existência de padrões formais que formem uma categoria, e tanto da perspectiva do autor, de que ele crie, ele se adeque, ele aceite as regras do jogo. A forma fixa é a construção de um padrão procedimental que funciona tanto a priori quanto a posteriori, e isso não se dá tão simplesmente lendo um poema com uma forma inusual e o transformando em forma fixa.
Marianne Moore, que na esmagadora maioria dos casos trabalhou com versos metrificados e rimados segundo esquema incomuns, tinha um método de escrita que mesclava a inspiração e o trabalho árduo. Alguns versos de repente lhe ocorriam e ela os dispunha de uma maneira tal na página em branco. Depois, quando a inspiração acabasse, quando o presente dos deuses fosse dado, ela pegava o resultado chegado e o repetia indefinidamente. Assim, supondo que de repente me ocorresse escrever uma estrofe com cinco versos seguindo uma métrica 7-3-2-7-7 e rimas AABXB, quando a inspiração acabasse eu basicamente repetiria quantas vezes achasse melhor o esquema. A questão é: eu posso pegar esse tipo de estrofe que acabei de inventar e que, por decisão minha, me impõe uma amarra, e dizer que se trata de uma forma fixa? Bem: se este for meu esforço; o esforço de algum modo sistematizá-la ou simplesmente dizer aos outro: "pratiquem"; então, sim, o que implicará uma abertura daquele tipo de estrofe a outros poetas e a efetiva prática deles (o que não quer dizer, claro, que dependa da minha anuência; posso não querer e, no frigir dos ovos, os outros acabarem praticando e se tornar). Assim sendo, a gênese da forma fixa é OU se fazendo o processo de transformação de coincidências formais numa equação procedimental, OU se criando uma equação procedimental com aquele fim.
O conluio entre as duas perspectivas é muito importante. Pois, embora a história das formas fixas seja uma história marcada pela arbitrariedade, não posso simplesmente pegar a estrofe de Poe em The Raven e dizer que aquilo ali é forma fixa. A forma fixa implica uma aceitação tanto do leitor, para que a perspectiva do leitor se valide, isto é, que se reconheça a existência de padrões formais que formem uma categoria, e tanto da perspectiva do autor, de que ele crie, ele se adeque, ele aceite as regras do jogo. A forma fixa é a construção de um padrão procedimental que funciona tanto a priori quanto a posteriori, e isso não se dá tão simplesmente lendo um poema com uma forma inusual e o transformando em forma fixa.
Marianne Moore, que na esmagadora maioria dos casos trabalhou com versos metrificados e rimados segundo esquema incomuns, tinha um método de escrita que mesclava a inspiração e o trabalho árduo. Alguns versos de repente lhe ocorriam e ela os dispunha de uma maneira tal na página em branco. Depois, quando a inspiração acabasse, quando o presente dos deuses fosse dado, ela pegava o resultado chegado e o repetia indefinidamente. Assim, supondo que de repente me ocorresse escrever uma estrofe com cinco versos seguindo uma métrica 7-3-2-7-7 e rimas AABXB, quando a inspiração acabasse eu basicamente repetiria quantas vezes achasse melhor o esquema. A questão é: eu posso pegar esse tipo de estrofe que acabei de inventar e que, por decisão minha, me impõe uma amarra, e dizer que se trata de uma forma fixa? Bem: se este for meu esforço; o esforço de algum modo sistematizá-la ou simplesmente dizer aos outro: "pratiquem"; então, sim, o que implicará uma abertura daquele tipo de estrofe a outros poetas e a efetiva prática deles (o que não quer dizer, claro, que dependa da minha anuência; posso não querer e, no frigir dos ovos, os outros acabarem praticando e se tornar). Assim sendo, a gênese da forma fixa é OU se fazendo o processo de transformação de coincidências formais numa equação procedimental, OU se criando uma equação procedimental com aquele fim.
Daqui você já deve ter visto que é crucial na forma fixa a ideia do espaço poemático. Podemos nos perguntar de onde surgiu tal concepção, no que certamente chegaríamos às origens cantadas da poesia (MATTHEWS, p. 8-9), isto é, de que era lícito que a composição tivesse um tamanho mais ou menos pré-definido para que não se estendesse em demasia ou para que simplesmente se adequasse ao público, sei lá. No capítulo I da Poética, Aristóteles diz que a epopeia, a poesia trágica, a comédia e a poesia ditirâmbica eram artes de imitação, imitação esta produzida pelo ritmo, linguagem e harmonia empregados separadamente ou em conjunto. Dado o caráter oral e originário da poesia, era natural que algumas fórmulas exitosas ressurgissem nas obras posteriores. Não é necessário que se analise a estrutura das narrativas populares, pois não me refiro apenas a um quesito narratológico; o enfoque que dou é na estrutura sonora de tais formas, naturalmente que indissociável do caráter narrativo. Pois onde quero chegar é que, com determinadas narrativas funcionando bem, e funcionando a partir de alguns instrumentos, com o passar dos anos e em especial com a perda do enfoque oral da poesia, isso fez com que poetas posteriores passassem a incorporar êxitos passados e os reproduzissem. Se deu certo lá, vai dar certo aqui. Em suma, imitaram. E aqui cumpre citarmos Pound (1989, p. 155):
A simetria ou as formas estróficas ACONTECERAM naturalmente na poesia lírica quando um homem estava cantando um poema longo ao som de uma melodia curta, que ele tinha de repetir muitas vezes. A simetria não tem nenhum tabu nem é nenhuma entidade sacrossanta. É um dos muitos artifícios, algumas vezes mero expediente, outras vezes recurso vantajoso para certos efeitos.
Citar o Dante de De vulgari eloquentia é mais do que necessário para que possamos parar um pouco e ouvir, como já advertia Pound, um dos poucos que realmente podem nos ensinar sobre poesia de maneira geral, especialmente sobre música e formas. Na parte IV, Dante diz que poesia é "invenção verbal composta de acordo com as regras da retórica e da música". Na parte VIII, começa a falar da canzone. Importante notar desde já que a canzone não era uma forma fixa, nos termos que impus; mas, todo modo, sua correlação com a música e, conforme dito, a história da forma fixa como rebento do conluio entre poesia e música, abrirá caminho para as reflexões de Dante e para as nossas. Assim, Dante, na parte VIII, diz que mesmo quem "harmoniza palavras" e as chama de canzone, embora elas estejam apenas escritas no papel, sem nenhum performer por trás, estará correto. De modo que "E agora fica claro que a canzone é nada mais que a ação independente de quem escreve palavras harmoniosas para serem postas em música"; depois: "de modo que devo afirmar aqui que não estamos discutindo só a canzone, mas também baladas e sonetos e todos arranjos de palavras, de qualquer tipo, que são baseados na harmonia, seja em vernáculo ou em linguagem regulada, devem ser chamados de canzone." Na parte IX, discute a estrofe, dizendo: "E sobre isto você deverá saber que esta palavra [estrofe] foi cunhada unicamente para o propósito de discutir a técnica poética, para que o objeto em que toda a arte da canzone seja consagrada deverá se chamar estrofe, isto é, um armazém espaçoso [a capacitous storehouse] ou o receptáculo em sua integridade. Pois assim como a canzone é o que envolve todo o seu assunto, assim a estrofe envolve toda a sua técnica; e as últimas estrofes do poema não devem aspirar adicionar nenhum artifício técnico novo, mas só se vestirem com o mesmo garbo da primeira." Na parte X, discutindo sobre a melodia da canzone e introduzindo a problemática da rima, "Disse, então, que toda estrofe é construída harmoniosamente para o propósito de ter uma melodia particular atrelada a ela. Mas é claro que as estrofes diferem de forma." Pois algumas estrofes, diz Dante, possuem uma só melodia do começo ao fim, enquanto outras apresentam uma diesis, isto é, "o movimento de uma melodia pra outra, a qual chamamos 'virada' [turn] em vernáculo". Como exemplos de estrofes com apenas uma melodia cita as de Arnaut Daniel, ou seja, que se valia de rimas extra-estróficas (por exemplo ABCD/ABCD/ABCD/etc) e não intra-estróficas (ABAB/ABAB/ABAB/etc), como hoje comumente se pode ver (e por isso Dante dizia que tinham apenas uma melodia).
O restante do tratado Dante começa a falar de aspectos específicos da construção da canzone. Continuo recomendado-o ao leitor; mas as reflexões já não nos concernem tanto.
Como se pode ver, o conluio era nítido. E o que cumpre notar é que um certo declínio imaginativo que respalda a virulência de Pound contra o soneto (idem, p. 128):
A arte da canção, a arte provençal sublimada por Sordello, se entorpece quando utiliza uma forma padrão. O soneto foi usado para a redação de cartas, para tudo quanto não necessitasse obrigatoriamente de uma nova melodia para cada novo poema.
Dentro da obra dantesca, sua definição de que a canzone pode até mesmo englobar o soneto explica a construção de alguns sonetos seus que hoje evidentemente não são mais tidos como soneto, tal qual o incluso na parte 7 do Vida Nova (2006, p. 23-24):
Vocês, na rua do Amor indo a passeio,
esperem, sem receio,
e sintam toda a dor do meu lamento.
Ouçam-me apenas, nada mais anseio.
Por isto, dói-me o seio:
Por fazer de um segredo o meu tormento.
Não por mérito meu, mas por grandeza
de sua alta nobreza,
o Amor tornou tão doce a minha vida
que as pessoas diziam, com surpresa:
"De algum astro é proeza
tanta alegria no rosto refletida."
Tendo perdido a força e a ousadia
que um tesouro de amor alimentava,
minha pobre alma escrava
tem medo de mostrar-se à luz do dia.
Como aquele que, pobre, esconde a face,
para ocultar as marcas da penúria,
na cara, escondo a fúria
da dor que me corrói a alma e a classe.
A dissociação entre poesia e música se deu nos séculos posteriores. Num mundo "racionalizado", cartesiano, a poesia passa a ser pensado em termos retóricos, vale dizer, pompas, pompas, pompas (vale dizer: retórica é pensar o impacto do discurso em determinado público; como o público era aristocrático, era preciso lançar mão de convenções pra afagar a plateia, e, daí, a pomposidade poética). Irei dar uma de bricoleur daqui até o final desta primeira parte; portanto, comecemos com Filliolet e Delas (1973, p. 19):
Como essa língua elegante concerne a uma elite social, a missão normativa latente da retórica muda de caráter. Tal ornamento não é mais preconizado, como para os Antigos, porque é mais conforme à eficácia do discurso ou porque é a melhor forma de colocar uma idéia ou um arrazoado, mas simplesmente porque está mais de acordo com o "bom tom". A normatividade retórica não é mais cogitada em termos de eficácia linguística, mas de estética sócio-cultural. Torna-se um código de marcas sociais valorizadas esteticamente. E, assim, a forma literária é direta, explícita e legalmente (vejam-se as premissas) visada.
Agora Massaud Moisés (1980, p. 63):
O Classicismo consistia, antes de tudo, numa concepção de arte baseada na imitação dos clássicos gregos e latinos, considerados modelos de suma perfeição estética. Imitar não significava copiar, mas sim a procura de criar obras de arte segundo as fórmulas, as medidas, empregadas pelos antigos. Daí a observância de regras, estabelecidas como verdadeiras antes da elaboração da obra literária: os escritores não tinham mais que observá-las, acrescentando-lhes a força de seu talento pessoal. Eram regras apriorísticas, mas não impediam o despertar e a manifestação das qualidades peculiares de cada um.
E de novo Filliolet e Delas (1973, p. 200):
Tendo como consequência (idem, idem, p. 201) o fato de que "a música 'natural' da linguagem poética e a música 'artificial' dos instrumentos e do canto são agora distintos", bem como no fato de que o apego do poeta a instrumentos como a metrificação e a rima aumentam pois agora são eles que integram a música na linguagem, vale dizer, a poesia se torna técnica e é anterior ao trabalho dos músicos.
Daqui já podemos perceber que a praticidade da aurora das formas fixas foi reduzida a termos matemáticos. Como diz Ricardo Domeneck em Feira de sextinas às sextas-feiras (2009),
De um lado, a música alcança um desenvolvimento técnico tal (triunfo do virtuosismo, extensão da polifonia) que a torna inacessível aos leigos. (...) De outro lado, e a partir de 1470, a difusão da imprensa fere mortalmente a concepção de um universo percebido por todos os sentidos humanos. Ela realiza uma verdadeira dissociação entre o escrito e o oral que, não fosse a imprensa, teriam conservado por mais tempo sua coerência e dinamismo. (...)
Tendo como consequência (idem, idem, p. 201) o fato de que "a música 'natural' da linguagem poética e a música 'artificial' dos instrumentos e do canto são agora distintos", bem como no fato de que o apego do poeta a instrumentos como a metrificação e a rima aumentam pois agora são eles que integram a música na linguagem, vale dizer, a poesia se torna técnica e é anterior ao trabalho dos músicos.
Daqui já podemos perceber que a praticidade da aurora das formas fixas foi reduzida a termos matemáticos. Como diz Ricardo Domeneck em Feira de sextinas às sextas-feiras (2009),
A sextina se transforma, por uma compreensão parca de sua forma, que se torna "forma fixa" ou "fórmula", pela ignorância de sua estrutura formal, funcional e contextual. A repetição, que tinha uma função musical, intrínseca à poesia oral, transforma-se em veículo para retórica ao ser transportada meramente para a página.
O impacto se deu tanto para a forma fixa observada da perspectiva do leitor quando da do autor. Verdadeira perda de liame prático, o modo de proceder do poeta para com um espaço poemático definido foi uma forma de afirmação de uma certa individualidade frente a uma realidade social específica, respaldada em padrões supra-humanos e assim desejados (como a Razão). Ou seja: o poeta necessitava se socorrer em convenções sócio-poéticas para o bom desenrolar de seu poema. Mas o desenlace entre poesia e oralidade/música já havia sido efetuado. Não quer dizer exatamente que a poesia perdeu seu liame prático: a poesia não só não o havia perdido como é sólido afirmarmos que ela é incapaz de perder. Ela ainda estava de olho e se estruturava de acordo com a própria composição de seu público. Se antes podia se valer de instrumentos orais e musicais, ótimo. Agora, todavia, face a um público aristocrático que requeria outras formas de fruição poética, os instrumentos eram outros, a pompa era outra. Agora é a hora daquilo que Paulo Leminski chamou de sequestro da poesia pela literatura (p. 61-63):
A lírica do Ocidente (a partir dos trovadores provençais da Idade Média) é um progressivo afastamento do texto e da música que o acompanhava.
Com a imprensa, a letra de música emudeceu na página branca.
E virou poema.
Que sempre foi lido, como sentido. E não enquanto forma. Enquanto lindo.
A beleza foi recuperada, na modernidade das vanguardas do século XX, com a conscientização da materialidade da linguagem escrita.
Descobriu-se a letra: enquanto corpo, enquanto carne, enquanto X.
(...)
Até chegarmos na aurora das vanguardas modernas, que vai de encontro ao movimento Simbolista, houve o profundo rompimento romântico que não só buscou raízes musicais da poesia, embora de maneira arrefecida, como bateu o martelo e fixou de maneira até hoje sentida a individualidade do artista, o Eu contra a figura posta numa hierarquia social/divina. Daí surgirem as ideias acerca da inspiração, chutando de lado um pouco a Musa, daí surgirem as interpretações individualizantes (até o limite das interpretações biográficas).
Antonio Candido (1975, vol. II, p. 26-27):
O verbo literário, simples medianeiro entre a natureza e o intérprete, vai perder a categoria quase sagrada que lhe conferia a tradição clássica. Uma nova era de experimentalismo modificará a fisionomia estabelecida do discurso, quebrando a separação entre os gêneros, derrubando a hierarquia das palavras e - mais importante que tudo - procurando forjar a expressão para cada caso, cada necessidade. O poeta neoclássico opõe de certo modo uma forte barreira ao mundo, tanto exterior quanto interior, na medida em que prefere exprimi-lo conforme categorias já estabelecidas; não permite que ele se insinue no espírito sob novas formas, brotadas de uma visão inesperada e fora dos cânones. (...)
Os românticos, porém, operando uma revisão de valores, não apenas vêem coisas diferentes no mundo e no espírito, como desejam imprimir à sua visão um selo próprio e de certo modo único, desde que a literatura consiste, para eles, na manifestação de um ponto de vista, um ângulo pessoal. O Sol nunca mais poderá ser a "Lâmpada Febéia", porque só interessa na medida em que iluminou um certo lugar, onde se deu algo, que nunca mais ocorrerá. (...) Daí a noção de que a palavra é um molde renovável a cada experiência, permanecendo sempre aquém da sua plenitude fugaz e irreproduzível. (...)
A atenção predominantemente voltada à forma também vai de encontro à revolução da proposição de Poe exposta em The Philosophy of Composition, de que o estabelecimento da forma do poema é anterior até ao ato da escrita. Ou seja, inverte o dado apriorístico da composição até então praticada. O comum, somos levados a pensar, é que primeiro eu penso no que vou escrever e só depois na forma, mas o processo de Poe foi o contrário.
A partir desta abertura proposta por Poe e os românticos, podemos chegar à poesia de Baudelaire que expõe, conforme Kathrin Rosenfield (1996, p. 138-139), um "frêmito do artifício", vale dizer, a demonstração do corroimento formal que a perfeição dos modelos clássicos representava. Para tanto, Baudelaire alia as formas consagradas da poesia a um trabalho formal incansável, para além de seu estilo já apontado como arcaico, com fins a demonstrar justamente o desgaste e a verdadeira incoerência de padrões tão polidos em tempos tão desgastados (e daí o fato de que até as imperfeições dos poemas de Baudelaire são chamadas de perfeitas [por exemplo por Guilherme de Almeida], além, é claro, do descompasso existente entre os padrões rígidos de construção de um poema como Uma carniça face à própria carniça descrita).
O espaço foi aberto e a modernidade trabalhou com frequência cada vez maior os aspectos formais do poema. A matemática vazia que havia se tornado o quesito da forma era gritante. Bastará que nos lembremos do establishment representado pelo Parnasianismo, laivo positivista que até incorporou algumas posições modernas no que tange o trabalho formal como sendo por vezes mais preponderante que o trabalho do conteúdo. Ou o constante uso de cavalgamentos que quebram a concepção até hoje hegemônica de que o verso deve conter dentro de si uma unidade de sentido (por exemplo, poucos tipos de verso livre usam-se de fato de cavalgamentos).
Tudo isso, é claro, muito inofensivo, ainda mais se comparado com a progressiva radicalidade de um Rimbaud ou um Mallarmé. O que levou à ojeriza das formas fixas e à radicalização dos processos românticos, sem, contudo, prejuízo à tradição. Pelo contrário. O que houve foi uma enorme absorção da tradição que pode muito bem ser vista nas ideias de um Pound ou de um Eliot. Pound, por exemplo, traduzindo livremente e modernamente Propércio, além de sua própria ideia de paideuma, ou Eliot com sua composição em colagens ou mesmo sua ideia de que bons poetas não imitam: roubam. No Brasil, a antropofagia de Oswald certamente devora toda uma tradição brasileira. Como, porém, isso quase que simplesmente não existia, pode-se entender a razão da repulsa para com a tradição europeizante imposta pela Primeira Geração.
Com o tempo, contudo, com a guerra, com tudo e todas as bombas, o estudo do passado e a animosidade em relação à modernidade provocaram uma ruptura com determinadas posturas. É quando no Brasil, por exemplo, Drummond se pergunta se voltará ao soneto, o que, bem sabemos, ele de fato fará no pós-guerra. Tempos depois, Ungaretti estaria voltando ao decassílabo sob a afirmação de que sempre fora o ritmo genuíno da língua italiana. Eliot, noutro exemplo, comporia os Quatro Quartetos, de estrutura notoriamente clássica. Era o retorno. Mais do que esperado, verdade seja dita, pois uma enorme tradição havia sido calcada naqueles modelos que, se historicamente representam uma deturpação do que a aurora das formas fixas representavam, de outro lado não podiam ser negados naquilo que eram, deturpados que fossem.
Com o passar dos anos e a entrada num período pós-utópico, as formas fixas parecem entrar novamente em crise. A urgência de se buscar maneiras de compôr poesia que extrapolem o fenômeno poético e permitam uma revivescência desta mesma poesia tem sido buscada de poetas lúcidos como um Ricardo Domeneck, a movimentos mais simples, páginas de facebook como Eu me chamo Antônio ou Pó de Lua. A performance, a interação é buscada em tempos líquidos, apartados. Dificilmente se procura a forma fixa hoje em dia, com exceção de alguns nomes aqui e ali que trabalham muito mais com os eventuais significados que uma forma fixa pode assumir do que efetivamente sua utilização demorada. A forma fixa como gotas de variação, prova de que vivemos em tempos de poesia múltipla (o que não é bem por aí), e não como pedra angular num projeto poético mais ou menos determinado.
A forma fixa pode até representar a ponta do iceberg daquilo que Iumna Simons chamou de retradicionalização frívola. Na verdade existem outros críticos contemporâneos que tratam do assunto sob outros nomes, seguindo mais ou menos a linha do ecletismo retrô cunhado por Haroldo de Campos. É a ideia de que o poeta contemporâneo pode se utilizar de todo o arcabouço da tradição de maneira isenta, passando o trator por cima da historicidade das formas. Como se enxergássemos novamente um processo análogo ao do surgimento das formas fixas, com a diferença de que visto do negativo: ou seja, enquanto as formas fixas representaram a matematização de resultados, desconsiderando a historicidade dos fenômenos, hoje, fazendo o mesmo, queremos alcançar uma liberdade que, sem consideração histórica, perde a maior parte de seu sentido e efetiva emancipação. É como se voltássemos ao estágio que Décio Pignatari (2006, p. 207) caracterizou de intuição poética: assim, por exemplo, o sonetista que intui sonetos, ou seja, não parece enfrentar nem oferecer ao leitor os desafios que a escrita poemática deveriam oferecer. Em termos análogos, Ricardo Domeneck diferenciando aqueles que usam-se da função soneto e não da forma soneto. Pois se a forma da obra literária, diz J. Tynianov (CHKLOVSKI; BRIK; TOMACHEVSKI, 1973, p. 102), não é estática mas sim dinâmica, compreende-se a densidade da ilusão que um poeta que enxergue na forma fixa apenas um padrão matemático e uma meta rumo ao poema pateticamente antológico estará incorrendo.
Ao mesmo tempo, devemos olhar com uma certa cautela posições tais como as de Iumna e Ricardo. A forma poética possui uma historicidade própria, o que quer dizer que ela sempre carregará consigo um lastro original de seu momento de criação, em especial aquelas formas que foram sistematizadas depois (ou seja, aquelas que não foram criadas in vitro). Elas sempre fazem parte da contextualidade, da temporalidade de seu próprio tempo, o que é um corolário do fato básico delas se valerem de instrumentos eminentemente coletivos como a língua e a poesia. Mesmo que o poeta realmente intente escrever algo de todo apartado do social ou do político, os instrumentos de que ele se vale não simplesmente possuem reentrâncias como em larga escala são politicamente estruturados. Todavia, as formas elas mudam assim como a poesia muda. Dizer que o poeta que se vale de uma forma fixa como o soneto, sem explorar suas possibilidades históricas aqui entendidas como uma comunicação com os clássicos, está incorrendo numa espécie de inocência... bem, é meio complicado dizer que o cara não incorre pois ele não está remetendo ao ponto-zero da forma literária. Considerar a historicidade não é simplesmente ter em mente o que se fazia quando a coisa pipocou. Sei que este não é grosso modo o argumento nem de Iumna nem de Ricardo, mas me parece ser uma leitura plausível do argumento de ambos. Onde quero chegar é: um raciocínio assim possui problemas pois quando falamos na historicidade de uma forma literária, no caso uma forma fixa, não estamos nos referindo simplesmente ao "considerar o como era feito no início". É entender também as mudanças que foram operadas e que nos permitem hoje, por exemplo, enxergar num soneto algo que se dá bem com a página em branco, apartada das raízes musicais; enxergar num soneto isto é ainda assim enxergar um soneto sem que necessariamente eu esteja incorrendo numa desconsideração tão fatal assim da historicidade da forma soneto. Não é nem considerar a origem nem a ponta do iceberg, mas o percurso todo, visto que a História não é só uma questão de origens. Ela é também, e ouso dizer que é principalmente, uma questão de percursos e persistências.
A forma fixa pode até representar a ponta do iceberg daquilo que Iumna Simons chamou de retradicionalização frívola. Na verdade existem outros críticos contemporâneos que tratam do assunto sob outros nomes, seguindo mais ou menos a linha do ecletismo retrô cunhado por Haroldo de Campos. É a ideia de que o poeta contemporâneo pode se utilizar de todo o arcabouço da tradição de maneira isenta, passando o trator por cima da historicidade das formas. Como se enxergássemos novamente um processo análogo ao do surgimento das formas fixas, com a diferença de que visto do negativo: ou seja, enquanto as formas fixas representaram a matematização de resultados, desconsiderando a historicidade dos fenômenos, hoje, fazendo o mesmo, queremos alcançar uma liberdade que, sem consideração histórica, perde a maior parte de seu sentido e efetiva emancipação. É como se voltássemos ao estágio que Décio Pignatari (2006, p. 207) caracterizou de intuição poética: assim, por exemplo, o sonetista que intui sonetos, ou seja, não parece enfrentar nem oferecer ao leitor os desafios que a escrita poemática deveriam oferecer. Em termos análogos, Ricardo Domeneck diferenciando aqueles que usam-se da função soneto e não da forma soneto. Pois se a forma da obra literária, diz J. Tynianov (CHKLOVSKI; BRIK; TOMACHEVSKI, 1973, p. 102), não é estática mas sim dinâmica, compreende-se a densidade da ilusão que um poeta que enxergue na forma fixa apenas um padrão matemático e uma meta rumo ao poema pateticamente antológico estará incorrendo.
Ao mesmo tempo, devemos olhar com uma certa cautela posições tais como as de Iumna e Ricardo. A forma poética possui uma historicidade própria, o que quer dizer que ela sempre carregará consigo um lastro original de seu momento de criação, em especial aquelas formas que foram sistematizadas depois (ou seja, aquelas que não foram criadas in vitro). Elas sempre fazem parte da contextualidade, da temporalidade de seu próprio tempo, o que é um corolário do fato básico delas se valerem de instrumentos eminentemente coletivos como a língua e a poesia. Mesmo que o poeta realmente intente escrever algo de todo apartado do social ou do político, os instrumentos de que ele se vale não simplesmente possuem reentrâncias como em larga escala são politicamente estruturados. Todavia, as formas elas mudam assim como a poesia muda. Dizer que o poeta que se vale de uma forma fixa como o soneto, sem explorar suas possibilidades históricas aqui entendidas como uma comunicação com os clássicos, está incorrendo numa espécie de inocência... bem, é meio complicado dizer que o cara não incorre pois ele não está remetendo ao ponto-zero da forma literária. Considerar a historicidade não é simplesmente ter em mente o que se fazia quando a coisa pipocou. Sei que este não é grosso modo o argumento nem de Iumna nem de Ricardo, mas me parece ser uma leitura plausível do argumento de ambos. Onde quero chegar é: um raciocínio assim possui problemas pois quando falamos na historicidade de uma forma literária, no caso uma forma fixa, não estamos nos referindo simplesmente ao "considerar o como era feito no início". É entender também as mudanças que foram operadas e que nos permitem hoje, por exemplo, enxergar num soneto algo que se dá bem com a página em branco, apartada das raízes musicais; enxergar num soneto isto é ainda assim enxergar um soneto sem que necessariamente eu esteja incorrendo numa desconsideração tão fatal assim da historicidade da forma soneto. Não é nem considerar a origem nem a ponta do iceberg, mas o percurso todo, visto que a História não é só uma questão de origens. Ela é também, e ouso dizer que é principalmente, uma questão de percursos e persistências.
II.
Observando as formas fixas, é interessante parar pra ouvir o clamor dos iconoclastas. Não pretendo ficar repetindo muito que devemos sempre ter em mente as raízes musicais das formas fixas, e que qualquer poeta que a trate apenas em termos matemáticos é no mínimo um inocente. Mas não vou também sucumbir ao argumento de que elas representariam uma esterilização do processo poético. Harold Bloom já dizia que a atividade poética é repressora. Obviamente que por razões bem distintas das que ofereço aqui; todo modo, o que de fato importa é um bom resultado, e esse resultado leva o poeta a ligar a linguagem na sua máxima voltagem (o que não quer dizer simplesmente uma atenção formal). O poeta como um curioso.
O que não quer dizer morte de formas. Do mesmo modo que embalsamar a atividade poética a uma tabelinha de bom-tom é matar a poesia por asfixia, dinamitá-la dá na mesma: e toda forma de matar a poesia, ou a arte, é e sempre será de um conservadorismo sem precedentes. Pois é evidente que tratar a inovação como morte de formas consiste numa leitura muito rasa das formalidades de um poema, como se elas fossem uma lista de caça. Assim fosse e muito provavelmente estamos no fim do caminho: tudo já foi dito e feito. Contra um argumento assim é sempre bom nos lembrarmos da contra-resposta de André-Gidè ("Só que como ninguém escuta, a gente tem que repetir tudo outra vez", aqui) como nos lembrarmos de que a expressividade poética não pode em momento algum ser medida apenas em termos de inovação tendida para o futuro ou a um apagar as pegadas na areia (dá na mesma). Claro que o trabalho do poeta acaba sendo voltado para o futuro, mas isto não quer dizer que ele deva procurar a inovação apenas pela inovação. Ricardo Domeneck fez excelentes reflexões acerca do quesito da inovação em seu fundamental Ideologia da percepção, de onde seleciono (2006):
Porque é inevitável que as escolhas formais de um poeta denunciem as distorções ideológicas de sua invenção da realidade. Mas toda forma está ligada ao momento cultural em que surgiu, como resposta às questões que premiam os poetas em seus contextos. (...) Assim, eu insisto que o desgaste das formas dá-se menos pela hipertrofia do uso que pela atrofia do contexto. Por extensão, todas as formas históricas só são viáveis ao poeta contemporâneo se nossa época combinar em si todas as características das épocas em que foram sendo criadas e acumuladas.
É mais do que óbvio, sendo assim, que a forma fixa pode reparecer em tempos pós-utópicos, pós-tudo. E ela sempre aparece, de maneira geral. O subsídio da poesia popular é em larga medida o do estoque clássico de composição, onde basta que se cite os cordéis e as inúmeras formas fixas que ele engendra. Se por um lado é óbvio que isto pode apontar de maneira geral ao conservadorismo da poesia popular (JAKOBSON, 2001, p. 139-141), a constatação deste fato só se dá devido a que, não sei se sabiam ou se suspeitavam, mas a maior parte da poesia que é feita é conservadora, vale dizer, não questiona, não combate, não respira. Apropria-se de descobertas anteriores e as utiliza de maneira meramente instrumental. Os bons poetas, que são aqueles que nadam contra a corrente e vão tanto contra o senso comum da sociedade de maneira geral como contra o senso comum poético (não preciso nem dizer que um é alimentado pelo outro), podem se encontrar tanto nas camadas mais populares quanto nas camadas mais elitizadas. Pode ser tanto um analfabeto quanto um acadêmico, sem exclusão de saberes literários que ambos possuam em sua trajetória (pois todo grande poeta é sempre um grande sabedor, um mestre da vida, dizia Maiakóvski).
E porventura a forma fixa pipoque, traga consigo seu olor de noigrandes. Como disse no começo do texto, podemos olhar para uma forma fixa também da perspectiva do autor. E aqui cumpre notar que o que chamei de "modo de proceder formal" pode ter variadas acepções que, de preferência, encontram um respaldo na construção sonora. Vale dizer: as formas fixas que conseguem se sustentar para o leitor de maneira mais detida são justamente aquelas que possuem um liame sonoro em sua estrutura, o que, conforme vimos, vai de encontro a seu próprio surgimento. Não digo com isto que formas fixas que não necessitem de um esquema rímico fixo não possam existir. Só que tais formas fixas que não necessitam de um esquema rímico para se definirem são geralmente formas fixas que envolvem a totalidade do poema e muito raramente partes deste. Além do mais, é comum que aquelas que não demandem um esquema rímico advenham de uma interpretação, pra variar deturpada, de um período histórico onde a rima simplesmente inexistia ou não era usada com nenhuma frequência, multiplicando, é claro, os níveis de arbitrariedade que lhe compõem. Seria o caso de uma ode pindárica. Aqui o processo gerativo de uma forma fixa, que seria, a saber, o da imitação e o da institucionalização de seu funcionamento a partir de fórmulas matemáticas, é ainda mais poderoso que no caso de uma forma como o soneto, onde, mal e mal, e apesar da música ter simplesmente se perdido no caminho, a musicalidade ainda assim continua latente (em tese). Além, é claro, do próprio fato de que dificilmente uma forma que goza de poucas similaridades formais com seus pares poderá ser reconhecida como fixa (questão essa que examinarei na próxima sessão).
O fato, porém, é que um modo de proceder formal dentro da estrutura poemática nunca é algo feito apenas no nível da superfície. Qualquer poeta que trate as questões formais de um poema apenas em termos de superfície certamente não está enfrentando a questão poética de maneira séria. Trabalhar a estrutura formal de um poema nós podemos dizer que é trabalhar sua tessitura rítmica. E o ritmo de um poema, sabemos desde Aristóteles, não pode ser reduzido a termos métricos, pois é evidente que os metros são parte do ritmo. Além disso, o ritmo, já dizia Massaud Moisés, "consiste na sucessão de unidades melódico-emotivo-semânticas movendo-se na linha do tempo, numa continuidade que gera a expectativa na sensibilidade e na inteligência do leitor." (2000, p. 129). A essa altura do campeonato eu não preciso nem mais dizer que não se trata de uma questão simplesmente de metro. Pois, a este respeito, B. Tomachevski muito bem nos lembra que "O domínio do ritmo não é o da contagem. Liga-se não à escansão artificial mas à pronúncia real." (1973, p.143) E aqui não é preciso muito para entender a afirmação, pois, como dito por Moisés, temos "unidades melódico-emotivo-semânticas", ou, em outros termos, mesmo que definamos o ritmo apenas como a sucessão de sílabas átonas e tônicas (como talvez, em seu esqueleto primordial, ele de fato seja [BOSI, 2000, p. 85]), resta explicitarmos qual seria a duração de cada sílaba átona ou tônica, algo, é mais do que óbvio, distinto de qualquer constância interna. Basicamente, cumpre aqui, como Óssip Brik diz, diferenciarmos o ritmo do resultado rítmico, este último capaz de fornecer apenas indícios daquele: "O poema imprimido num livro também não oferece senão traços do movimento. Somente o discurso poético e não o seu resultado gráfico pode ser apresentado como um ritmo." (1973, p.132).
Ainda dentro dos formalistas russos, Victor Chklovski, em seu arquifamoso A Arte como Procedimento, falando da prosa, emite julgamento que a meu ver pode muito bem ser aplicado aonde quero chegar: "Repito contudo aqui que o importante no paralelismo é a sensação de não-coincidência de uma semelhança. O objetivo do paralelismo, como em geral o objetivo da imagem, representa a transferência de um objeto de sua percepção habitual para uma esfera de nova percepção; há portanto uma mudança semântica específica." (1973, p. 54) Na mesma página, agora sobre a linguagem poética, "[o caráter estético vindo da linguagem poética] é criado conscientemente para libertar a percepção do automatismo".
Onde desejo chegar é ao fato de que o modo de proceder formal de um poema nunca é apenas formal, mas acaba, logicamente, afetando o próprio conteúdo que veicula (JAKOBSON, 2001, p. 146-147)). Aqui eu poderia tentar desmantelar o binômio forma-conteúdo e substituí-lo pela proposição formalista de material-procedimento. Não creio que reduzir a equação poética a estes termos seja correto. Como também não creio que a escola formalista o tenha proposto, de maneira geral. Se observarmos da perspectiva da forma, me parece claro que, na prática, material e procedimento é o que existe e caracteriza a forma. Mas não se pode com isso relegar o próprio conteúdo do poeta a segundo plano.
Rimar dois versos, por exemplo, e assim podemos resumir as citações que fiz, não quer dizer apenas rimar desinências. Claro que isto afeta a estrutura sonora do poema, como muito bem estudado por Filiolet e Delas: "Os pontos fortes do desenho melódico são suscetíveis de indicar, antes de qualquer outra análise, alguns lugares privilegiados da estruturação poética." (1973, p. 183). Mas o ponto aqui é que se trata de, literalmente, rimar dois versos, ou seja, fazer com que a aproximação entre dois versos rimados seja ao menos à priori maior que a de dois versos não-rimados, pois estes versos rimados ganham um liame fundamental: o ritmo análogo. Logo, da perspectiva do autor o trabalho com uma forma fixa é comumente um trabalho em projeções e expectativas. Se o autor se propõe a adequar-se dentro da forma do pantum, isto equivale a dizer que ele traça uma rota de colisão, digamos, antes mesmo de ligar o motor. E aqui nada de mais óbvio. Como também não deve ser nem um pouco surpreendente o fato de que com frequência ele "sacrifica" a expressão em prol da forma.
Certamente que um poeta inepto termina por aí mesmo. Um poeta desacostumado com os liames que uma forma fixa sempre envolve e que sempre requer do poeta uma visão de jogo mais ampla. Visão de jogo, leiam bem. O poeta sabe das regras. A questão aqui não pode ser reduzida simplesmente a termos de expressão ser sacrificada em prol da forma, pois as formas fixas possuem uma expressão por si só. Muito mais que as formas poéticas de maneira geral, óbvio que com exceção daquelas que traduzem estados sentimentais muito vastos e fazem parte de praticamente toda cultura poética humana (por exemplo, odes e elegias; voltaremos já já a respeito disso), a forma fixa carrega estratos de significado com um grau de inalterabilidade poderoso. Os grandes mestres de uma forma fixa gravam seu nome dentro dela com uma notoriedade diferente... vívida. Claro que algo favorecido pela fixidez de sua definição. Sendo assim, o poeta não pode dizer bem que sacrifica sua expressão em prol da forma, pois o chegar ao resultado da forma fixa e ser reconhecido, para o leitor, ao lado de todos aqueles que antes a praticaram, poder ter seu quinhão nesta pequenina notoriedade. Podemos dizer que se perde uma expressão, um significado, se vier a ser o caso, mas que se ganha em relação a outros, especialmente no que chamamos de tradição.
Mas vejam bem. Eu disse "pequenina notoriedade". O embate com a tradição não é posto em termos tão amigáveis ou simplistas assim. As coisas não funcionam literalmente assim: fez bem então parabéns, fique ao lado de todos para a foto. Primeiro que há o caso daquele praticante da forma fixa que não se vê na necessidade de sacrificar a expressão em prol da forma. Ele conhece as regras do jogo e consegue traçar uma rota de colisão com tamanho sucesso que o ritmo de seu pensamento já parece ser moldado em termos fixos.
Não preciso nem dizer que é um enorme perigo. Pois se nem o verso livre, já dizia Eliot, é de fato livre quando o poeta quer fazer um bom trabalho, com a questão das formas fixas se trata de algo ainda mais óbvio. O poeta está frente a toda um processo culturmorfológico. Não deixa de ser uma associação simples o fato de que, se escrevo um pantum, estou ao lado de todos que escreveram um pantum. Na prática, contudo, a coisa é muito diferente.
Diferente pois a escrita de um poema em forma fixa, e mesmo uma eventual mestria em escrevê-los, não querem dizer muita coisa. Forma fixa é tratada em correspondências matemáticas. A questão simplesmente não é ter dificuldades em escrever um poema numa forma fixa, pois ter habilidade nisto, por si só, não quer dizer praticamente nada. O poeta que se pergunta o que é preciso para ser um bom sonetista está completamente fora do caminho. A questão não é o que é preciso para que um soneto seja considerado bom. É preciso que se considere o que é preciso para que se escreva um bom poema. E perseguir um bom poema é perseguir a contemporaneidade. Daí o perigo sempre presente de que, ao escolher uma forma fixa, ele volte umas vinte casas na situação toda. Não só pois existe de fato uma tendência a que as formas fixas esterilizem a expressão de um poeta graças ao fato de que elas envolvem uma tessitura pré-concebida que, nas mãos de artistas inábeis, envolve um contorcionismo infantil; não apenas por estes aspectos, mas também pelo fato de que com frequência o poeta não observa o que aquela forma fixa significa e pode significar em seu contexto. Pois, como disse, os nomes canônicos resplendem com muito mais força na constelação das formas fixas que na constelação da poesia de maneira geral. Assim o poeta que quer escrever um soneto e acha que poderá encontrar respostas válidas na análise dos sonetos de Camões, como se a forma fixa tivesse implicado, com isso, fixidez histórica.
Vamos tentar colocar os termos de maneira bem clara. O que significa escrever um soneto hoje, 2014? Significa escrever um soneto não só depois de Dante, Camões, Bilac, Vinicius. Significa escrever um soneto depois de cummings. Depois de Paulo Henriques Britto. De Tony Harrison. Depois, em outras palavras, do poeta contemporâneo que lançou ontem, olha só, uma coletânea de sonetos que enfrentou a contemporaneidade da maneira como você deveria estar enfrentando agora. Ou seja: é claro que o problema é muito mais complexo. A esfinge, a tentação de simplesmente cair no "trabalho feito" que toda forma fixa envolve, deve ser afastada de lado pela necessidade muito mais premente de escrever um bom poema. E escrever um bom poema sempre envolverá uma relação com a forma fixa muito maior e mais viva que simplesmente com a matemática fria dela.
Senão vejamos: Coleridge, em Shakespeare's judgement equal to his genius (1907), dividiu as formas do poema entre a forma orgânica, inata e advinda com a escrita do poema, portanto natural, e a forma mecânica, proposta antes mesmo da escrita do poema. Depois, Herbert Read manteve a ideia da forma orgânica mas observou na forma fixa não uma forma mecânica, mas uma forma abstrata.
O que isso quer dizer?
Quer dizer que, na prática, uma forma fixa não implica nem de longe em fixidez total. Se tomamos como base as já citadas reflexões acerca do ritmo, você poderá perceber que nem mesmo se se tratar a forma fixa apenas em sua crosta dá pra se falar em cadeia ou coisa do tipo. Uma forma fixa é até, de certa maneira, bastante livre, e daí a modificação de Herbert Read: ela é abstrata. Você pode falar sobre qualquer coisa dentro daquele terreirinho. Só não pode ferir as estruturas do jogo, pois aí seria demais...
Seria?
E porventura a forma fixa pipoque, traga consigo seu olor de noigrandes. Como disse no começo do texto, podemos olhar para uma forma fixa também da perspectiva do autor. E aqui cumpre notar que o que chamei de "modo de proceder formal" pode ter variadas acepções que, de preferência, encontram um respaldo na construção sonora. Vale dizer: as formas fixas que conseguem se sustentar para o leitor de maneira mais detida são justamente aquelas que possuem um liame sonoro em sua estrutura, o que, conforme vimos, vai de encontro a seu próprio surgimento. Não digo com isto que formas fixas que não necessitem de um esquema rímico fixo não possam existir. Só que tais formas fixas que não necessitam de um esquema rímico para se definirem são geralmente formas fixas que envolvem a totalidade do poema e muito raramente partes deste. Além do mais, é comum que aquelas que não demandem um esquema rímico advenham de uma interpretação, pra variar deturpada, de um período histórico onde a rima simplesmente inexistia ou não era usada com nenhuma frequência, multiplicando, é claro, os níveis de arbitrariedade que lhe compõem. Seria o caso de uma ode pindárica. Aqui o processo gerativo de uma forma fixa, que seria, a saber, o da imitação e o da institucionalização de seu funcionamento a partir de fórmulas matemáticas, é ainda mais poderoso que no caso de uma forma como o soneto, onde, mal e mal, e apesar da música ter simplesmente se perdido no caminho, a musicalidade ainda assim continua latente (em tese). Além, é claro, do próprio fato de que dificilmente uma forma que goza de poucas similaridades formais com seus pares poderá ser reconhecida como fixa (questão essa que examinarei na próxima sessão).
O fato, porém, é que um modo de proceder formal dentro da estrutura poemática nunca é algo feito apenas no nível da superfície. Qualquer poeta que trate as questões formais de um poema apenas em termos de superfície certamente não está enfrentando a questão poética de maneira séria. Trabalhar a estrutura formal de um poema nós podemos dizer que é trabalhar sua tessitura rítmica. E o ritmo de um poema, sabemos desde Aristóteles, não pode ser reduzido a termos métricos, pois é evidente que os metros são parte do ritmo. Além disso, o ritmo, já dizia Massaud Moisés, "consiste na sucessão de unidades melódico-emotivo-semânticas movendo-se na linha do tempo, numa continuidade que gera a expectativa na sensibilidade e na inteligência do leitor." (2000, p. 129). A essa altura do campeonato eu não preciso nem mais dizer que não se trata de uma questão simplesmente de metro. Pois, a este respeito, B. Tomachevski muito bem nos lembra que "O domínio do ritmo não é o da contagem. Liga-se não à escansão artificial mas à pronúncia real." (1973, p.143) E aqui não é preciso muito para entender a afirmação, pois, como dito por Moisés, temos "unidades melódico-emotivo-semânticas", ou, em outros termos, mesmo que definamos o ritmo apenas como a sucessão de sílabas átonas e tônicas (como talvez, em seu esqueleto primordial, ele de fato seja [BOSI, 2000, p. 85]), resta explicitarmos qual seria a duração de cada sílaba átona ou tônica, algo, é mais do que óbvio, distinto de qualquer constância interna. Basicamente, cumpre aqui, como Óssip Brik diz, diferenciarmos o ritmo do resultado rítmico, este último capaz de fornecer apenas indícios daquele: "O poema imprimido num livro também não oferece senão traços do movimento. Somente o discurso poético e não o seu resultado gráfico pode ser apresentado como um ritmo." (1973, p.132).
Ainda dentro dos formalistas russos, Victor Chklovski, em seu arquifamoso A Arte como Procedimento, falando da prosa, emite julgamento que a meu ver pode muito bem ser aplicado aonde quero chegar: "Repito contudo aqui que o importante no paralelismo é a sensação de não-coincidência de uma semelhança. O objetivo do paralelismo, como em geral o objetivo da imagem, representa a transferência de um objeto de sua percepção habitual para uma esfera de nova percepção; há portanto uma mudança semântica específica." (1973, p. 54) Na mesma página, agora sobre a linguagem poética, "[o caráter estético vindo da linguagem poética] é criado conscientemente para libertar a percepção do automatismo".
Onde desejo chegar é ao fato de que o modo de proceder formal de um poema nunca é apenas formal, mas acaba, logicamente, afetando o próprio conteúdo que veicula (JAKOBSON, 2001, p. 146-147)). Aqui eu poderia tentar desmantelar o binômio forma-conteúdo e substituí-lo pela proposição formalista de material-procedimento. Não creio que reduzir a equação poética a estes termos seja correto. Como também não creio que a escola formalista o tenha proposto, de maneira geral. Se observarmos da perspectiva da forma, me parece claro que, na prática, material e procedimento é o que existe e caracteriza a forma. Mas não se pode com isso relegar o próprio conteúdo do poeta a segundo plano.
Rimar dois versos, por exemplo, e assim podemos resumir as citações que fiz, não quer dizer apenas rimar desinências. Claro que isto afeta a estrutura sonora do poema, como muito bem estudado por Filiolet e Delas: "Os pontos fortes do desenho melódico são suscetíveis de indicar, antes de qualquer outra análise, alguns lugares privilegiados da estruturação poética." (1973, p. 183). Mas o ponto aqui é que se trata de, literalmente, rimar dois versos, ou seja, fazer com que a aproximação entre dois versos rimados seja ao menos à priori maior que a de dois versos não-rimados, pois estes versos rimados ganham um liame fundamental: o ritmo análogo. Logo, da perspectiva do autor o trabalho com uma forma fixa é comumente um trabalho em projeções e expectativas. Se o autor se propõe a adequar-se dentro da forma do pantum, isto equivale a dizer que ele traça uma rota de colisão, digamos, antes mesmo de ligar o motor. E aqui nada de mais óbvio. Como também não deve ser nem um pouco surpreendente o fato de que com frequência ele "sacrifica" a expressão em prol da forma.
Certamente que um poeta inepto termina por aí mesmo. Um poeta desacostumado com os liames que uma forma fixa sempre envolve e que sempre requer do poeta uma visão de jogo mais ampla. Visão de jogo, leiam bem. O poeta sabe das regras. A questão aqui não pode ser reduzida simplesmente a termos de expressão ser sacrificada em prol da forma, pois as formas fixas possuem uma expressão por si só. Muito mais que as formas poéticas de maneira geral, óbvio que com exceção daquelas que traduzem estados sentimentais muito vastos e fazem parte de praticamente toda cultura poética humana (por exemplo, odes e elegias; voltaremos já já a respeito disso), a forma fixa carrega estratos de significado com um grau de inalterabilidade poderoso. Os grandes mestres de uma forma fixa gravam seu nome dentro dela com uma notoriedade diferente... vívida. Claro que algo favorecido pela fixidez de sua definição. Sendo assim, o poeta não pode dizer bem que sacrifica sua expressão em prol da forma, pois o chegar ao resultado da forma fixa e ser reconhecido, para o leitor, ao lado de todos aqueles que antes a praticaram, poder ter seu quinhão nesta pequenina notoriedade. Podemos dizer que se perde uma expressão, um significado, se vier a ser o caso, mas que se ganha em relação a outros, especialmente no que chamamos de tradição.
Mas vejam bem. Eu disse "pequenina notoriedade". O embate com a tradição não é posto em termos tão amigáveis ou simplistas assim. As coisas não funcionam literalmente assim: fez bem então parabéns, fique ao lado de todos para a foto. Primeiro que há o caso daquele praticante da forma fixa que não se vê na necessidade de sacrificar a expressão em prol da forma. Ele conhece as regras do jogo e consegue traçar uma rota de colisão com tamanho sucesso que o ritmo de seu pensamento já parece ser moldado em termos fixos.
Não preciso nem dizer que é um enorme perigo. Pois se nem o verso livre, já dizia Eliot, é de fato livre quando o poeta quer fazer um bom trabalho, com a questão das formas fixas se trata de algo ainda mais óbvio. O poeta está frente a toda um processo culturmorfológico. Não deixa de ser uma associação simples o fato de que, se escrevo um pantum, estou ao lado de todos que escreveram um pantum. Na prática, contudo, a coisa é muito diferente.
Diferente pois a escrita de um poema em forma fixa, e mesmo uma eventual mestria em escrevê-los, não querem dizer muita coisa. Forma fixa é tratada em correspondências matemáticas. A questão simplesmente não é ter dificuldades em escrever um poema numa forma fixa, pois ter habilidade nisto, por si só, não quer dizer praticamente nada. O poeta que se pergunta o que é preciso para ser um bom sonetista está completamente fora do caminho. A questão não é o que é preciso para que um soneto seja considerado bom. É preciso que se considere o que é preciso para que se escreva um bom poema. E perseguir um bom poema é perseguir a contemporaneidade. Daí o perigo sempre presente de que, ao escolher uma forma fixa, ele volte umas vinte casas na situação toda. Não só pois existe de fato uma tendência a que as formas fixas esterilizem a expressão de um poeta graças ao fato de que elas envolvem uma tessitura pré-concebida que, nas mãos de artistas inábeis, envolve um contorcionismo infantil; não apenas por estes aspectos, mas também pelo fato de que com frequência o poeta não observa o que aquela forma fixa significa e pode significar em seu contexto. Pois, como disse, os nomes canônicos resplendem com muito mais força na constelação das formas fixas que na constelação da poesia de maneira geral. Assim o poeta que quer escrever um soneto e acha que poderá encontrar respostas válidas na análise dos sonetos de Camões, como se a forma fixa tivesse implicado, com isso, fixidez histórica.
Vamos tentar colocar os termos de maneira bem clara. O que significa escrever um soneto hoje, 2014? Significa escrever um soneto não só depois de Dante, Camões, Bilac, Vinicius. Significa escrever um soneto depois de cummings. Depois de Paulo Henriques Britto. De Tony Harrison. Depois, em outras palavras, do poeta contemporâneo que lançou ontem, olha só, uma coletânea de sonetos que enfrentou a contemporaneidade da maneira como você deveria estar enfrentando agora. Ou seja: é claro que o problema é muito mais complexo. A esfinge, a tentação de simplesmente cair no "trabalho feito" que toda forma fixa envolve, deve ser afastada de lado pela necessidade muito mais premente de escrever um bom poema. E escrever um bom poema sempre envolverá uma relação com a forma fixa muito maior e mais viva que simplesmente com a matemática fria dela.
Senão vejamos: Coleridge, em Shakespeare's judgement equal to his genius (1907), dividiu as formas do poema entre a forma orgânica, inata e advinda com a escrita do poema, portanto natural, e a forma mecânica, proposta antes mesmo da escrita do poema. Depois, Herbert Read manteve a ideia da forma orgânica mas observou na forma fixa não uma forma mecânica, mas uma forma abstrata.
O que isso quer dizer?
Quer dizer que, na prática, uma forma fixa não implica nem de longe em fixidez total. Se tomamos como base as já citadas reflexões acerca do ritmo, você poderá perceber que nem mesmo se se tratar a forma fixa apenas em sua crosta dá pra se falar em cadeia ou coisa do tipo. Uma forma fixa é até, de certa maneira, bastante livre, e daí a modificação de Herbert Read: ela é abstrata. Você pode falar sobre qualquer coisa dentro daquele terreirinho. Só não pode ferir as estruturas do jogo, pois aí seria demais...
Seria?
III.
O soneto aponta para um fenômeno interessante na história das formas fixas. Não tenho como fornecer uma base para o que vou dizer, mas é que: o soneto talvez tenha sido a forma fixa mais praticada da história. Quais as razões? Sua musicalidade, sua estrutura, sua perfeição?... Seus antepassados?... Não me cabe analisar quais as razões. Afasto, é claro, qualquer razão que se valha de uma espécie de metafísica do soneto, pois, a bem verdade, diz Octavio Paz (1956, p. 16-17),
Um soneto não é um poema mas uma forma literária, exceto quando esse mecanismo poético - estrofes, metros e rimas - foi tocado pela poesia. Há maquinas de rimar, não de poetizar. (...) Um poema é uma obra. A poesia se polariza, se congrega e se isola num produto humano: quadro, canção, tragédia. O poético é poesia em estado amorfo; o poema é criação, poesia que se ergue. (...) O poema não é uma forma literária, mas o lugar de encontro entre a poesia e o homem. O poema é um organismo verbal que contém, suscita ou emite poesia. Forma e substância são a mesma coisa.
É possível que as razões estejam no sentido de "seus antepassados" mesmo. Vários poetas no passado o usaram. Pound já nos lembrava que o soneto era uma espécie de carta literária, o que sua utilização em muitos momentos pelos poetas do dolce stil nuovo ou pelos elizabetanos aponta. Tornou-se, sendo assim, prático meio de alcance de status. E aí, como verdadeiros titãs praticaram a fôrma, tendo em vista a expansão cultural italiana durante o Renascimento, isso criou todo um lastro que, concomitante às formações nacionais, deu ao soneto um belo de um campo para que estrategicamente se espraiasse.
Onde quero chegar, contudo, é que o soneto foi... "se degradando". Entre aspas por tudo o que já vimos. Daí foi transposto ao período elizabetano, por exemplo, onde o espírito prático de seus criadores permitiu o engendramento de uma variedade de formas que corrobora com o que disse acerca das necessidades de expansão formal da poesia irem de encontro a liames práticos, e lá ele saiu do modelo italiano e se metamorfoseou no modelo inglês. Do mesmo modo que ganhou estrambote com Aretino. Do mesmo modo como começou a perder suas rimas com o Romantismo. Do mesmo modo como se expandiu-retraiu, saudoso do Trecentto, em nomes como Donne ou Hopkins. Do mesmo como perdeu sua pontuação com Mallarmé. Do mesmo modo como virou isso:
A DEATH SONNET FOR CUSTER.
Walt Whitman.
I.
From far Montana's cañons,
Lands of the wild ravine, the dusky Sioux, the lonesome stretch, the silence,
Haply, to-day, a mournful wail—haply, a trumpet note for heroes.
II.
The battle-bulletin,
The Indian ambuscade—the slaughter and environment
The cavalry companies fighting to the last—in sternest, coolest, heroism.
The fall of Custer, and all his officers and men.
III.
Continues yet the old, old legend of our race!
The loftiest of life upheld by death!
The ancient banner perfectly maintained!
(O lesson opportune—O how I welcome thee!)
As, sitting in dark days,
Lone, sulky, through the time's thick murk looking in vain for light, for hope,
From unsuspected parts, a fierce and momentary proof,
(The sun there at the center, though concealed,
Electric life forever at the center,)
Breaks forth, a lightning flash.
IV.
Thou of sunny, flowing hair, in battle,
I erewhile saw, with erect head, pressing ever in front, bearing a bright sword in thy hand,
Now ending well the splendid fever of thy deeds,
(I bring no dirge for it or thee—I bring a glad, triumphal sonnet;)
There in the far northwest, in struggle, charge, and saber-smite,
Desperate and glorious—aye, in defeat most desperate, most glorious,
After thy many battles, in which, never yielding up a gun or a color,
Leaving behind thee a memory sweet to soldiers,
Thou yieldest up thyself.
Não quero dizer que o poema de Whitman é um soneto. Nem mesmo se o considerarmos um caudal sonnet hopksiniano ou um heroic sonnet. Nem assim. Dificilmente nós vamos conseguir aceitar que se trate de um soneto. Não bem no sentido de que hoje qualquer coisa pode ser um soneto. Não é bem por aí. Mas poderia vir a ser. É um fenômeno muito interessante o de notar como a tendência histórica das formas fixas mais célebres tenha sido a de ser surrada. O que, paulatinamente, expande suas fronteiras até um ponto aceitável, ou seja, um ponto em que, se pusermos o poema-rebelde-X ao lado de todos os que ele afirma serem seus irmãos, nós pudermos ver um padrão confortável e de longe para que os possamos chamar todos de família. Por isso, por exemplo, é de fato muito complicado chamar o "soneto" acima de Whitman de soneto. É completamente diferente de um juízo feito sobre um soneto de Dante pois quando Whitman escreveu seu "soneto" o soneto já era muito bem o que era, e pois o soneto de Dante guarda algumas semelhanças intrínsecas com o arcabouço estrutural do que hoje se considera como soneto.
Assim, afora algumas variações canônicas do soneto, podemos dizer que ele não tem assim tantas variantes. Seria o caso de reconhecermos, quando muito, o italiano, o inglês, o estrambótico, o branco, o sonetilho... Dificilmente uma categoria como a acima, de Whitman. Não é meu objetivo discutir esse tipo de coisa aqui. Se querem mesmo saber, acho que as três únicas pessoas que a essa altura do campeonato podem parar pra discutir essas picuinhas são os professores e os alunos de cursos de escrita, e os tradutores.
Onde desejo chegar é à tese principal de que o soneto foi se degradando.
Degradando ou desgarrando?
Um pouco dos dois.
Mas sem exagerar. Pois a questão simplesmente não é essa. O que importa, por exemplo, o fato do soneto de Whitman não ser considerado soneto? Me referi a isso na parte anterior e aqui eu repito: só mesmo um poeta menor pode querer tanto ser chamado de sonetista, ou ter algo seu reconhecido no hall da fama do soneto. Mais uma vez repito: a questão não é escrever um bom soneto, mas um bom poema. Um bom poema que seja reconhecido como soneto será também um bom soneto; mas aí vamos estar reduzindo. Pois ser bom poema é mais abrangente e importante que ser bom soneto. Não precisa passar pelo ser "bom soneto". Pode até passar longe, pode até dar a entender que o autor era muito burro. Mas continuará sendo um bom poema.
A questão é até simples. O soneto, tendo em vista que talvez seja a forma fixa mais fulcral dentro do Ocidente, ganhou um significado maior que o de ser simplesmente reduzido a termos matemáticos. É uma faceta mais obscura do soneto que somente um bom poeta pode observar, visto que, de resto, Harold Bloom já nos lembrava que só mesmo na obra de um bom poeta nós podemos enxergar a angústia da influência, vale dizer, o rol de precursores que aquele poema carrega dentro de si.
O soneto se tornou num objeto quase que autônomo, uma categoria abstrata, um termo mais ou menos tão genérico como a ode ou a elegia, evidentemente que sem o mesmo grau de alcance que tais formas chegaram, visto que elas são muito mais antigas. Chegaram primeiro. Mas um dia é de se supor que o soneto se tornará algo tão abstrato, tão dono de significados por si-só, que poderá estar na mesma posição que a ode ou a elegia. Pois vejam, por exemplo, como o simples título "elegia" no maravilhoso Uma elegia de Mirta Rosenberg (aqui) é capaz de dar significados quase que sem precisar do próprio poema. A ideia do poema triste, do poema fúnebre... O modo como uma forma poética faz luzir o nome de toda uma tradição quando colocamos o frágil cristal da forma em direção ao sol, encontra, nestes casos, não bem um amontoado de fotos muito bem precisas daqueles que imprimiram sua marca no gênero (e, repito, não porque foram bons poetas daquilo, mas porque foram bons poetas), mas significados nebulosos que ajudam muito mais o poeta no sentido de encontrar um material a princípio mais rico, mais vívido, mais disposto a interagir com o poeta de maneira orgânica, se quisermos voltar a Coleridge.
Elegia chora. Quando Mirta termina dizendo "Una elegía, / cada vez com más razón.", ela evoca significados dentro da forma elegia que dificilmente um pantum carregaria. É um movimento não de degradação das formas fixas, mas de nítido enriquecimento, onde o que passa a importar deixa de ser a matemática anódina para dar lugar ao terreno da geração espontânea.
Dentro da língua inglesa uma forma como a vilanela caminha aos poucos para um sentido assim. É difícil, naturalmente, dizermos quais seriam os significados à priori postos a uma forma como o soneto nesta sua longa (longa?) estrada rumo à nebulosa de significados apriorísticos. Quem sabe ele nunca chegue lá, visto que nunca esteve relacionado a um tônus próprio, como o caso da elegia, que sempre foi triste. Ou graças ao fato de que se constitui como forma fixa de maneira mais premente, também ao contrário da elegia, que nunca foi bem forma fixa. Mas pode chegar a um lugar longe, pode criar uma pequena nebulosa como, aliás, hoje possui.
O que importa destacar no poema de Whitman não é o fato dele não ser soneto. Uma análise que se limite a esta verificação só pode estar de brincadeira! No poema de Whitman, são os significados do termo "soneto" que Whitman evoca. Você pode enxergar Shakespeare a partir do soneto de Whitman. E Whitman não quer se ombrear com Shakespeare apenas imitando um campo. Dentro dos termos de Harold Bloom, encarar o soneto não mais como uma forma fixa mas como um campo para que se trave e se transpareça a angústia da influência é uma característica muito mais premente do poeta forte que do efebo. O efebo prefere exteriorizar a figura de seu precursor. O poeta forte, pelo contrário, a interioriza, a trata como assunto do id e não do superego. É quando a festa começa. As chispas surgem. Os martelos ringem. O campo se incendeia.
IV.
É possível falar em perspectivas para a forma fixa na poesia contemporânea?
As de sempre. As que comentei antes. Pois é entendendo na contemporaneidade não só um apelo para o agora, como também um apelo para a estrutura das recorrências e influxos históricos de seu tempo (o que nos leva à tradição, ao processo culturmorfológico) bem como, falava Kandinsky, o poder peculiar de ver o amanhã no hoje; é entendendo a complexidade e o fascínio do contemporâneo que o poeta se enriquece e de fato escreve poesia.
Para tal, é preciso que o poeta acabe de vez com essa ideia de forma fixa apenas como fator de inclusão ou como praça de convites. Já me referi em texto anterior (aqui) ao fato de que, no ambiente cibernético, o leitor tende a se tornar autor e, entre tantos impactos deste bandeamento, ele passe a enxergar na forma fixa e na sua posterior cunhagem uma maneira de pertencimento que pode ser tanto literal, ou seja, criar uma forma fixa para que ela seja atualizada por outros, quanto no sentido de pertencer a uma tradição da maneira mais ilusória possível.
Chega disso.
Um reconhecimento cada vez mais amplo das necessidades das formas fixas com fins a, quem sabe, finalmente lhes dar de volta o antigo relevo performático de outrora (e aqui eu novamente remeto o leitor ao texto acerca da sextina, de Domeneck), ou, no mínimo, um contato com a forma fixa de maneira a extrair o máximo possível de significados de tal contato. Make it necessary.
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Para chegar a tais conclusões, tudo isso daqui me ajudou bastante:
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