Direito e Poesia.





O
artigo Quem estuda somente Direito não estuda direito, de José Osterno Campos de Araújo, levanta boa poeira. É confortante para o operador do Direito saber que existe uma luz no fim do túnel e ele não vai se tornar um autômato ou escravo da masturbação-concurso-público. Em tese, é o que o aspirante deve ouvir ao longo de seu preparatório: de que o Direito está além do âmbito da leis e que a lei é, quando muito, uma fonte do direito privilegiada por pataqui patacolá. A citação do poema de Auden é também boa. Anexei minha tradução para ele, que vem bem a calhar na discussão.

Mas até aí, sem muitos traumas. A aproximação entre Direito e Literatura apontada por Osterno Campos é, em alguns momentos, uma aproximação esperada, uma aproximação clínica: a Literatura forneceria histórias e o Direito se aproveitaria para provar suas habilidades, os limites de sua legislação, um quebra-cabeças talvez lúdico. Necessário, é certo; nessas horas a Literatura costuma ajudar bastante. O operador do Direito precisa testar suas ferramentas.

Outra aproximação é a de catar referências jurídicas, sair, com a lupinha, e procurar um juiz, uma lei, um princípio, uma norma, um julgamento, uma escritura, um contrato, um divórcio. Geralmente isso tudo ou montando burrinho em cima de Kafka ou num tênue aspecto biográfico como "o eminente fulano de tal formou-se em Direito (...)". E, logo após o bip!, buscar compreender a concepção jurídica destes autores, comparar o que um ilustre escritor, um argumento de autoridade saído do forno, tem a nos dizer sobre os palavrões jurídicos e a nova edição, com todos os rodapés atualizados, do Manual de Direito. Via de regra um prazer masoquista, esse trabalho todo pra no final descobrir que o autor queria mais era que o Direito se.

Repito que são abordagens frutíferas. Mas só isso?

Mais ou menos. Um outro ponto de vista bem mais satisfatório está resumido na fórmula proposta por Lênio Streck de que a aproximação entre Direito e Literatura deve se dar no sentido não de encontrarmos a ficção da realidade, mas a realidade da ficção. Sim, é por aí mesmo. Realmente, uma boa sacada. Mas nem sempre o Direito está pronto para explorar as implicações que tal afirmação impõe. Para não dizer que a fórmula proposta por Streck tanto muda e não muda tanto: continua dependendo da ficção.

A maior dessas implicações nos conduz ao consenso e bom-senso de que a formação em Direito está longe de ser apenas um conhecer instrumentos, esmiuçar aspectos, reentrâncias e saídas da lei. É bastante óbvio que o operador do Direito deve estar antenado com qualquer coisinha, deve possuir um conhecimento de mundo o mais amplo possível para que consiga, justamente (!), captar um dos aspectos mais básicos do funcionamento do próprio Direito, que seria o do mecanismo hermenêutico ou simplesmente o vamos-ver-na-prática.

Qualquer maneira de dar a este operador uma convivência mundana a mais crítica, lúcida e ponderada possível merece um lanche. E aí me parece bastante claro que a aproximação com a Arte é uma tacada daquelas. Mas, como disse, essa aproximação está longe de ter tido os desenvolvimentos esperados, possíveis e satisfatórios.

Principalmente porque, no campo de Direito e Arte, as duas únicas áreas que têm conseguido se firmar de modo produtivo são as aproximações entre Direito e Literatura, Direito e Cinema. O que não chega a ser algo muito espantoso pois tanto a Literatura quanto o Cinema são, à priori, formas de se contar uma história, no que aquela abordagem clínica vem com tudo. Mas onde está a aproximação entre Direito e, por exemplo, Música? Vladimir Passos de Freitas já aludia acerca desta deficiência em Direito e música é tema rico e pouco explorado. Claro que o autor acaba reduzindo os aspectos musicais apenas às reentrâncias da letra ("comparando-se letras de canções e a aplicação do Direito"), o que não mudaria muito o panorama da aproximação entre Direito e Arte depender de um fio, de um enredo; mas a indagação é realmente boa.

Vamos direto ao ponto. O título do texto é Direito e Poesia. À priori, isso não é algo tão difícil de se pensar pois Poesia está no balaio de Direito e Literatura e a Literatura é amiguinha do Direito.

Mas será mesmo?

Poesia não é bem literatura. Como diz Paulo Leminski, durante um certo tempo pós-Gutemberg, a poesia foi raptada pela literatura. Para Ezra Pound, a boa poesia está mais próxima da pintura e da música que de fato da literatura. E, para Paulo Prado, os dois maiores inimigos da poesia são a literatura e a filosofia.

A palavra poética possui um funcionamento e um trabalho por trás que estão um tanto longe dos meros índices de referencialidade da linguagem corriqueira ou mesmo da prosa comum. Para o poeta, a palavra é coisa e não signo. Ela possui uma preponderância quase que concreta, possui todos os seus aspectos, do sonoro ao visual, trabalhados como fonte semântica. A poesia pega a linguagem em seu nível puramente instrumental, de sua utilização apenas num contexto de tenho-que-me-comunicar, e lhe dá uma nova dimensão que nem a prosa consegue. Transforma o que é moeda de troca no bolso ou no bueiro e lhe dá uma exuberância insuspeita e renovadora.

"Mesa" não é só a palavra que se refere àquilo com quatro pernas onde eu pus meu filtro de barro; é também esse "m", esse "e", esse "s" com som de "z", essa possibilidade de que, se eu espichar daqui, alongar de lá, virar de cabeça pra baixo e depois jogar uma purpurina pode se tornar uma mesa figurativamente. Ou pode se tornar uma metáfora para as relações familiares, como em Drummond, ou pode acoplar a palavra "mesma" ou "mês", pode rimar com "ilesa", "defesa" e "presa". Enfim. Acho que já deu pra entender que estamos falando, de modo resumido, da linguagem ligada à sua máxima voltagem, e a tal ponto que às vezes o que o poeta tem a dizer não é nem tanto importante graças ao conteúdo, ao que-está-por-trás, mas justamente o que está na frente e, ao contrário do que diz o senso comum (de que poesia é abstração), consegue trazer com tanta concreção, consegue trazer de modo quase que palpável uma mensagem que só mesmo assim, tudo-significando-tudo, ousaria ser dita.

Tomemos o famoso poema de Décio Pignatari:




É óbvio que o trabalho com a palavra em Décio não é apenas a palavra em estado de dicionário. O poeta trabalha com todos os lados, todos os valores, todas as possibilidades que ela pode dar, desde a fonte utilizada, o espaço em branco, as semelhanças fônicas, as paranomásias... Níveis semânticos, eu repito. Significados.

E aqui já podemos desaguar numa pergunta talvez incômoda: se Direito e Arte é uma aproximação tão fácil assim, então que tal aproximarmos Direito e o poema do Décio? É possível, não é mesmo?

Lógico que, se o Direito for depender de um enredo ou de um fio da meada, ele vai naufragar: um poema não tem. A leitura de poesia não é palavra-puxa-palavra, mas um enorme bolo onde eu leio ao mesmo tempo este verso e o anterior e o que eu ainda não li. Duvida? Pois saiba que basta você encarar um poema rimado para que aquela expectativa rítmica te faça ler o verso lá na frente sem você nem mesmo ler. E mesmo que lá na frente o verso nem seja rimado, e o poeta tenha te enganado, aquele engano faz parte da leitura. No poema concreto, essa simultaneidade do discurso poético é apenas evidenciada. Você bate o olho no poema de Décio e parece que lê tudo ao mesmo tempo. De uma vez. Num golpe, um golpe que lembra o de um anúncio de marketing que, aliás, o Plano Piloto da Poesia Concreta sempre quis se aproximar: arte coerente com o agora. E aí é hora do poema concreto exorcizar a poesia da sua disposição gráfica de verso linear, de página comportada e se brincar até mesmo de página, o que se aproxima do campo poesia e performance. E se o leitor acha que isso tudo é um absurdo, ele está redondamente enganado, pois isso é mais antigo do que se pensa, bastando que se lembre da afirmação de Leminski e, logo depois, se observe, sem nenhum espanto, que poemas "proto-concretos" já existiam na Grécia Antiga, para não dizer nas performances musicais de formas hoje em dia infelizmente só poéticas como o soneto ou a sextina.

Assim sendo, colocar o Direito e Arte ao lado de uma historinha, de um divã e de uma Legislação vai se tornar uma sequência de palpites ou zombeteiros ("esses poetas!") ou incômodos (isso de dizer com palavras diferentes e longas, que o Direito adora), visto que a poesia quando muito tem um enredo incerto e jamais um enredo certo, mesmo num poema de matizes narrativos: e aí acho que basta abrir qualquer Romanceiro, de Garrett a Cecília Meireles, pra entender do que estou falando.

O grande mérito do poema de Décio é o de desmantelar o slogan de uma das marcas capitalistas mais célebres ao nível da sexualidade, como que ao nível da perversão que toda marca exaustivamente vendida gera no indivíduo. Pode parecer ser pouco. Podíamos esperar uma grande mensagem, um espalhafato. Uma máquina do mundo. Mas é muito. Acreditem, é muito e é maravilhoso. E é feito de modo inteligente. Você pode ter certeza que Décio não escolheu essa fonte tipográfica apenas porque a achou bonitinha. A semelhança, por exemplo, do "o" com o "a" ligados à "cloaca" no final está nos dizendo algo. Está desconstruindo conceitos. Comentário análogo posso fazer aos espaços em branco, a uma possível referência a Fernando Pessoa ("Primeiro estranha-se, depois entranha-se"), à semelhança fônica entre palavras como "beba" e "babe", "coca" e "caco", ou na sequência digestiva que vai desde o "beba coca cola" até a "cloaca" no final passando por "babe cola" e "caco / cola" (se imaginou cagando cacos que viram cola? Pois é. Beba Coca Cola).

É nesse nível de compreensão que Poesia e Direito não são uma aproximação tão pacata. O Direito reina no império do dever ser, no império normativo, no império imperativo. Nas súmulas enormes do STF que fagocitam Mário Quintana para encorpar e humanizar, para passar pela cordinha da retórica e demonstrar facetas de um caleidoscópio também conhecido como vaso espatifado. Já a poesia desconstrói. Ela resiste. A Coca-Cola que aparece no bar, depois de Décio, não vai ser nunca a mesma Coca, assim como a mesa de Drummond ou de Bashô nunca vai ser a mesma mesa (!) em que agora escrevo meu texto. A poesia bate de frente contra a barbárie, ela humaniza num processo obviamente distinto do da prosa, sem se valer de personagens ou de histórias, mas a partir da reconciliação com a imagem, com o som, com a redescoberta do instrumento, da linguagem, do discurso. Dos sentimentos cruamente expostos. Sim, cruamente expostos: ou você acha que para alguém transformar "coca cola" em "cloaca" estava sendo joalheiro ou que o valha? Nem com Bilac era assim.

Claro que não se trata de demonizar o Direito e santificar a Poesia. Um e outro podem servir aos propósitos da opressão, o que não é nenhuma novidade (veja-se o caso da Proletkult soviética). Bem como nos da emancipação, verdade seja dita (experimente garantir uma conquista social sem respaldo jurídico). Mas, em contornos gerais, é inegável a recusa do discurso poético frente a discursos normalizadores, dentre os quais o Direito bate palmas. Afinal de contas, historicamente o Direito adorou cortar as asinhas da produção artística, bastando que se note, no âmbito da literatura, obras como Madame Bovary, Ulysses ou o poema Uivo (ou o recente Edital de Criação Literária da Funarte, comentado por Luciano R. M. aqui). E sempre com afirmações parecidas: de ofensa à moral pública. Obscenidade. O Direito não pode ver um pinto. Incrível.

Oras: todas as obras citadas são obras onde existe um trabalho eminentemente poético do texto. Um trabalho inventivo, um trabalho questionador. As fronteiras entre poesia e prosa não são tão facilmente demarcáveis: o trabalho de Joyce no Ulysses, em estâncias tais quais as das palavras-valise, as mudanças estilísticas, as variações de discurso, trocadilhos, referências, canções, o fluxo de consciência etc são trabalhos que se avizinham de procedimentos poéticos como o polissíndeto acoplado a versos whitmanianos e bíblicos do Uivo de Ginsberg.

Certo que uma discussão assim se aproxima da tão afamada liberdade de expressão, virada ao avesso nas chacotas racistas e machistas. Contudo, não creio que ela deixe de demonstrar a evidente falta de jeito e o descompasso do Direito ao reduzir tão grotescamente à ofensa à moral pública tais obras, o que acaba demonstrando também os danos de se pensar a aproximação entre Direito e Arte apenas em termos ficcionais: isto é, vislumbrou-se na obscenidade explícita de um livro como o Ulysses apenas seus aspectos mais superficiais, sem nem mesmo passar pela cabeça dos juristas o rígido processo de invenção e reinvenção de Joyce. A decisão judicial a favor do Ulysses, em 1933, por John M. Woolsey, encontrou escapatória justamente nestes termos: "In writing 'Ulysses', Joyce sought to make a serious experiment in a new, if not wholly novel, literary genre. (...) is a sincere and serious attempt to devise a new literary method for the observation and description of mankind."

Trazendo pra cá a discussão abordada pelo poeta contemporâneo Ricardo Domeneck aqui, aproximação Direito-Arte em termos puramente ficcionais é uma aproximação teleológica, é reduzir objetos artísticos a meros artefatos históricos que ajudem a compreender um determinado tempo, quando, pelo contrário, bons objetos artísticos nos ajudam a entender como determinado artista usou de uma estética como est-É-tica, como superação de imposições contemporâneas e como validação da fórmula de Alfredo Bosi: poesia-resistência, arte-resistência. Não é simplesmente uma coleta de costumes e hábitos a seu redor; é muito mais um questionamento e uma implosão que ainda hoje repercute e pode suscitar soluções análogas: por exemplo, a poesia multilíngue dum Raimbaudt de Vaqueiras (1180 - 1207) não está apenas tacitamente recolhendo, compendiando o saber de sua época para que os pósteros guinchem; é um trabalho de resistência a seu próprio tempo, de embate que, como disse, repercute tanto antes como depois, por exemplo, na poesia também multilíngue dum Ezra Pound (1885 - 1972). Se pensarmos tão somente em fins ou ficcionais ou teleológicos do objeto artístico como testemunho passivo, vamos automaticamente negar a negação implícita que a feitura artística nunca deixou de carregar em seu bojo.

Tais constatações mostram que aproximar Direito e Arte e depender de um fio da meada certamente ignora as potencialidades oferecidas. E ignora mesmo. Por mais que peguemos uma história tão somente contada, a forma como ela é contada geralmente esconde mais surpresas que apenas entender ou buscar discutir os meandros, os conflitos, os casos em que o Direito poderia agir. Ou os casos que se tornem um enorme laboratório para enriquecer compêndios ou testar leis, formalizar interpretações num tempo onde a interpretação é reconhecida como pedra basilar do entendimento jurídico.

Se compreendemos que a aproximação entre Direito e Arte tem como fim o alcance de uma visão de mundo que se faça a mais ampla possível, o que, é óbvio, não deve advir também apenas da Arte, é hora de estourar a boiada. Por quê não se pensa Direito e Pintura, ou Direito e Quadrinhos, ou Direito e Videogames?

Nem sempre estas expressões artísticas poderão nos fornecer casos. Histórias. Relatos. Ao menos não no âmbito do começo-meio-fim, num formato fetal de investigação, depoimento. E que bom que não forneçam. Um jogo como GTA não se reduz apenas a um enredo ou à discussão proibir-ou-não-proibir, violento-ou-não-violento. A mecânica sandbox possui seus significados. A mecânica geral dos videogames, aliás, a sua interatividade poderia ser posta ao lado da mecânica do dever-ser jurídico de modo muito mais inteligente que reduzir a coisa de adolescentes (Daniel Galera falou disso muito bem nO Globoaqui). Assim como é ridículo reduzir o discurso poético apenas a uma confissão emocional, é também ridículo reduzir o Batman: the dark knight de Frank Miller à história de super-herói e não ver a própria desconstrução do super-herói, a pesada discussão sobre violência em todos os níveis (urbana, estatal, militar, policial, apocalíptica) num mundo onde o ser humano não pode ser humano, onde o batmóvel é um tanque de guerra e Robin uma garota que resolve simplesmente acompanhar os passos de um brutamontes renascido; que não se veja o como a história é contada: os traços fortes da HQ, às vezes caóticos, com uma monotonia de cores, os quadros repletos de intromissões externas, repletos de onomatopeias e informações jornalísticas que se mesclam a pensamentos e "tomadas de câmera" que raramente evidenciam a cena toda...

Não, não há que se aproximar Direito e Arte para que a Arte somente sirva aos propósitos do pensamento jurídico. Só para que seja uma boa fornecedora de causos. Pois mesmo que relativizemos o saber jurídico como nunca puramente jurídico, não tem problema nenhum que o operador do Direito que queira se aproximar da Arte conheça de Arte e saiba discuti-la não apenas em parâmetros jurídicos, mas em parâmetros artísticos e principalmente parâmetros humanos. São parâmetros assim que a Arte nos mostra e que o Direito deve procurar. Dentro de si, dentro da arte, fora de si e fora da arte. Em todo lugar. Onde tenha vida. Onde o auto automaticamente não chegue.




(Auden e Benjamin Britten. Da esquerda pra direita. Não caiam na inocência de pensar que o amor aludido por Auden é o amor heterossexual. Retirado do The Guardian)

§

LEI TAL QUAL O AMOR.

Lei, diz o jardineiro, é o sol,
Lei é só
O que se acata
Ontem, hoje e amanhã.

Lei é sabedoria anciã
Na voz de nossos avós, fraca;
Os netos que fazem pirraça,
Leis são as antenas da raça.

Lei, sacerdotisa o sacerdote
No sacerdócio dos céticos,
Lei é a Lei de Deus, Sábia e Forte,
Lei é meu púlpito e meu cetro.
Lei, diz o juiz, nariz em pé,
Falando clara e severamente,
Lei é o que disse anteriormente,
Lei, você sabe o que é,
Lei, explico novamente,
Lei é Lei.

Porém, os juristas conversam,
Lei não é errada ou certa.
Lei é crime
Punido onde se consuma,
Lei é a roupa por nós usada
Sem data ou hora marcada,
Lei é Bom-Dia e Boa-Noite.

Para outros, Lei é Fado;
Para outros, Lei é Estado;
Uns dizem, outros dizem,
Lei é não mais,
Lei é o que não volta mais.

E sempre multidão barulhenta
Fazendo barulho, barulhenta,
Lei é o Nós
E é sempre o Eu, tolo de leve, levemente.

Se, meu bem, sabemos não mais
Que eles sobre a Lei,
Se eu, não mais que você,
Sei do que se deve fazer,
Exceto que assentem,
Miseráveis ou contentes,
Que a Lei é
E que todo saber é,
Se portanto pensar é absurdo
E absurdo é buscar outro estudo,
Então ao contrário de tantos
Não digo: a Lei está melhorando,

Pois, não mais que eles, inibimos
A ânsia de sermos adivinhos,
Sair de nossa posição
Rumo a outra condição.
E embora eu ao menos confine
Tua vanidade e a minha
Pra emitir timidamente
Uma igualdade igualmente,
Vamos nos gabar:
Tal qual o amor.

Tal qual o amor, não sabemos porquê,
Tal qual o amor, não sabemos voar,
Tal qual o amor, não sabemos chorar,
Tal qual o amor, não sabemos manter.